terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

AS ONDAS GRAVITACIONAIS



Quatro pontos para entender a descoberta que confirma teoria de Einstein e muda modo como vemos Universo

11/02/2016

Há 100 anos, Albert Einstein previu a existência de ondas gravitacionais como parte de sua Teoria Geral da Relatividade.

Durante décadas, os cientistas vinham tentando, sem êxito, detectar essas ondas - fundamentais para entender as leis que regem no Universo.

Isso até esta quinta-feira - um dia que já vem sendo considerado histórico, já que um grupo de cientistas de vários países anunciou ter conseguido detectar pela primeira vez as chamadas ondas gravitacionais.

Essa comprovação é uma das maiores descobertas da ciência do nosso tempo porque, além de confirmar as ideias de Einstein, abre as portas para maneiras totalmente novas de se investigar o Universo. A partir de agora, a astronomia e outras áreas da ciência entram uma nova era.

Os pesquisadores do projeto LIGO (Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory, ou observatório de Interferometria de Ondas Gravitacionais), em Washington e na Lousiana, observaram o fenômeno e acompanharam distorções no espaço com a interação de dois buracos negros a 1,3 bilhão de anos-luz da Terra.

Mas o que exatamente essa descoberta significa? Veja quatro dos principais pontos.
O que exatamente são ondas gravitacionais?

Segundo a teoria de Einstein, todos os corpos em movimento emitem essas ondas que, como uma pedrinha que afeta a água quando toca nela, produz perturbações no espaço.

A Teoria da Relatividade de Einstein é um pilar da física moderna que transformou nosso entendimento do espaço, do tempo e da gravidade. E por meio delas entendemos muitas coisas: da expansão do Universo até o movimento dos planetas e a existências dos buracos negros.

Essas ondas gravitacionais são basicamente feixes de energia que distorcem o tecido do espaço-tempo, o conjunto de quatro dimensões formado por tempo e espaço tridimensional.

Assim, qualquer massa em movimento produz ondulações nesse tecido tempo-espaço. Até nós mesmos.

E Einstein previu que o Universo estava inundado por essas ondas. Esse efeito, no entanto, é muito fraco, e apenas grandes massas, movendo-se sob fortes acelerações, podem produzir essas ondulações em um grau razoável.

Assim, quanto maior essa massa, maior é o movimento e maiores são as ondas. Nessa categoria entram explosões de estrelas gigantes, a colisão de estrelas mortas super-densas e a junção de buraco negros. Todos esses eventos devem radiar energia gravitacional na velocidade da luz.
Como os cientistas detectaram essas ondas?

Os pesquisadores trabalhavam há anos para detectar as minúsculas distorções causadas quando as ondas gravitacionais passam pela Terra. Os detectores nos Estados Unidos - localizados no Ligo - e na Itália (conhecido como Virgo) são ambos formados por dois túneis idênticos em forma de L, de 4 km de comprimento. Os norte-americanos, usados para a descoberta, estão separados por 3 mil km.

Nele, um feixe de laser é gerado e dividido em dois - uma metade é disparada em um túnel, e a outra entra pela segunda passagem.

Espelhos ao final dos dois túneis rebatem os feixes para lá e para cá muitas vezes, antes que se recombinem. Se uma onda passa pelo túnel, ela vai distorcer levemente seu entorno, mudando a longitude dos túneis em uma quantidade diminuta (apenas uma fração da largura de um átomo).

E a forma com que as ondas se movem pelo espaço significa que um túnel se estira e outro se encolhe, o que fará com que um raio laser viaje uma distância levemente maior, enquanto o outro fará uma viagem mais curta.

Como resultado, os raios divididos se recombinam de uma maneira diferente: as ondas de luz interferem entre si, em vez de se cancelarem. Essa observação direta abre uma nova janela para o cosmos, uma janela que não seria possível sem Einstein.
E qual a implicação disso?

Os objetos também emitem essas perturbações que acabaram de ser detectadas, mas a partir de agora os físicos poderão olhar os objetos com as ondas eletromagnéticas e escutá-los com as gravitacionais.

"Agora, o que se tem são sentidos diferentes e complementares, para estudar as mesmas fontes. E com isso, podemos extrair muito mais informações", disse à BBC Mundo, Alicia Sintes, do departamento de física do Instituto de Estudos Espaciais da Catalunha, na Espanha, que participou do projeto.

"Não estamos falando de expandir um pouco mais o espectro eletromagnético, mas de um espectro totalmente novo."

A especialista afirma as ondas eletromagnéticas dão informações do Universo quando ele tinha 300 mil anos de idade.

"Já com as ondas gravitacionais, pode-se ver as (ondas) que foram emitidas quando o Universo tinha apenas um segundo de idade."

É isso que será possível estudar a partir de agora.

Outro impacto diz respeito aos buracos negros: nosso conhecimento sobre a existência deles é, na verdade, bastante indireto. A influência gravitacional nos buracos negros é tão grande que nem a luz escapa de sua força. Mas não podemos ver isso em telescópios, só pela luz da matéria sendo partida ou acelerada à medida que chega muito perto de um buraco negro.

Já as ondas gravitacionais são um sinal que vem desses objetos e carrega informações sobre eles. Nesse sentido, pode-se até dizer que a recente descoberta significa a primeira detecção direta dos buracos negros.
Qual o efeito causado por essas ondas na Terra?

Quando as ondas gravitacionais passam pela Terra, o tempo-espaço que nosso planeta ocupa deve se alternar entre se esticar e se comprimir.

Pense em um par de meias: quando você as puxa repetidas vezes, elas se alongam e ficam mais estreitas.

Os interferêmetros do Ligo, aparelhos usados para medir ângulos e distâncias aproveitando a interferência de ondas eletromagnéticas, vêm buscando esse estiramento e compressão por mais de uma década.

A expectativa era a de que ele detectaria distúrbios menores do que uma fração da largura de um próton, a partícula que compõe o núcleo de todos os átomos.



É como ouvir após surdez, diz físico que ajudou a provar teoria de Einstein

12/02/2016

A última quinta (11) foi histórica para a ciência. O anúncio de que ondas gravitacionais previstas por Albert Einstein há 100 anos na Teoria da Relatividade foram identificadas mudará a astrofísica e promete fazer "ouvidos humanos" chegarem a pontos longínquos do universo. Sim, os ouvidos. É esta a principal metáfora utilizada por quem atuou no projeto, como o italiano Riccardo Sturani, que atualmente é pesquisador do IFT-Unesp (Instituto de Física Teórica da Universidade Estadual Paulista).

"Temos agora um novo canal para explorar o universo. É como se, depois de uma surdez, começássemos a ouvir. Tem um mundo novo que vai ser descoberto. Vamos detectar fontes que não eram detectadas, como buracos negros. Vamos poder ouvir mais objetos, porque não emitindo luz não podem ser vistos. Agora podemos ouvir as assinaturas deles, como produzem e como se comportam no espaço-tempo", disse Sturani, em entrevista ao UOL.

A comparação com nossos ouvidos tem um motivo curioso: segundo o pesquisador italiano, as ondas gravitacionais têm a mesma frequência de ondas sonoras. A diferença entre ambas, contudo, é grande: enquanto ondas sonoras são levadas pelo ar, as gravitacionais são carregadas pelo espaço-tempo.
Como é possível saber a origem da onda?

Caltech/MIT/LIGO Laboratory/Handout
Este é um dos equipamentos nos Estados Unidos que ajudou a captar ondas gravitacionais pela primeira vez na história


O pesquisador participa do estudo que revolucionou a astrofísica desde 2008, quando ainda estava em seu país natal. Sturani ajudou no desenvolvimento da modelização do sinal na Itália até 2012. Em 2013, veio ao Brasil e seguiu atuante no projeto, com análises de dados. O anúncio de quinta veio para corroborar o trabalho de físicos de 16 países, mas foi anunciado por norte-americanos - entenda mais sobre a pesquisa.

Nos Estados Unidos, estão situados os dois equipamentos que captaram as ondas gravitacionais, identificadas como produzidas pelo choque de dois buracos negros de tamanhos modestos a mais de um bilhão de anos-luz. Como é possível ter a certeza disso?

"Tem uma mudança na frequência da onda. A partir de como muda dá para estimar a massa dos dois buracos negros. A partir da massa e da distância, dá para saber a amplitude dos buracos negros. Dá para medir a distância comparando com a massa e a mudança da frequência. A precisão das massas é de 10%, até pouco menos. A da distância é de 50%", explicou Sturani.
As implicações do estudo – Big Bang mais perto de ser "ouvido"?

Thinkstock
Big Bang também deve ter gerado ondas gravitacionais


Mas o que mudará com o estudo? Muita coisa. Primeiro, que a Teoria da Relatividade prevista por Einstein está agora totalmente comprovada. Mais importante que isso é que cada vez mais eventos do universo poderão ser identificados – como dito, antes só tínhamos olhos para o universo que permitiam enxergar apenas o que emite ou reflete luz, agora também temos ouvidos.

"Podemos chegar mais fundo no universo, as ondas gravitacionais não interagem com quase nada. É uma viagem no passado tanto quanto é a arqueologia. A amplitude delas diminui com a distância, mas tirando isso ela se propaga muito. Se encontra uma galáxia no meio, não perde energia. Isso é bom porque fontes distantes não perdem energia, mas um lado ruim é que precisa de equipamentos muito sofisticados. A energia das ondas é pequeniníssima", contou Sturani.

Se pudemos ouvir as ondas de dois buracos negros que se fundiram há muito tempo, quer dizer que estamos mais perto de captar o nosso Big Bang, correto? Mais ou menos, de acordo com o pesquisador italiano.

"Do Big Bang daria para conseguir, tem a possibilidade que tenha produzido ondas gravitacionais, mas em outra frequência. Precisaria de um detector completamente diferente. São detectores que identificam ondas gravitacionais cósmicas de fundo, são ondas gravitacionais super-pequenas, dos primórdios. Já estão pesquisando, mas até agora não tiveram evidências", relatou o pesquisador da Unesp.
Primeiro anúncio foi só o início

As ondas gravitacionais foram captadas por equipamentos chamados de LIGO, que estão nessa investigação desde 2002. Por oito anos, nada foi captado. Em 2010, passou por uma recalibragem e ficou ligado por quatro meses a partir de setembro do último ano. Os dados já anunciados que revolucionaram a ciência dizem respeito apenas a análises de dados das duas primeiras semanas. Nos próximos meses, outras novidades podem surgir.

A novidade, contudo, não para por aí. No fim deste ano, o equipamento ganhará um terceiro detector, que está sendo instalado na Itália. Com este terceiro objeto, será possível triangular as ondas gravitacionais – ou seja, poderá identificar de que direção do universo ela teve origem e aí levar os dados para um observatório tradicional apontar o telescópio. O LIGO ainda está em constante atualização e estima-se que sua sensibilidade máxima seja alcançada em 2020. É difícil imaginar quais informações ainda estão por vir.

http://noticias.uol.com.br/ciencia/ultimas-noticias/redacao/2016/02/12/e-como-ouvir-apos-surdez-diz-fisico-que-ajudou-a-provar-teoria-de-einstein.htm