quarta-feira, 25 de março de 2015

OS PLANETAS PERDIDOS DO SISTEMA SOLAR


25/03/15

Você já reparou como muitos dos sistemas planetários descobertos até agora têm vários planetas localizados em órbitas bem pequenas, bem menores que as da Terra? Pois bem. Agora uma dupla de astrônomos nos Estados Unidos está propondo que o Sistema Solar também pode ter sido assim nos seus primórdios, com vários planetas maiores que o nosso ocupando órbitas mais internas.


Será que o Sistema Solar já foi parecido com Kepler-11, sistema que tem seis planetas maiores que a Terra em órbitas próximas de sua estrela? Uma dupla de pesquisadores acredita que sim. (Crédito: Nasa)

Certo, fácil falar. Mas onde estão esses planetas agora? De acordo com simulações realizadas por Greg Laughlin, da Universidade da Califórnia em Santa Cruz, e Konstantin Batygin, do Caltech (Instituto de Tecnologia da Califórnia), esses mundos primordiais teriam sido destruídos por um evento cataclísmico, e foi isso que viabilizou o posterior surgimento da Terra. Se os pesquisadores estiverem certos, mundos de pequeno porte e com atmosferas modestas, como o nosso, podem ser bem mais raros do que antes se imaginava.

A conclusão é bombástica, porque enfatiza que muitos dos planetas detectados fora do Sistema Solar que, pelo porte, se assemelhariam à Terra podem na verdade ser completamente diferentes. “Dramaticamente, nosso trabalho implica que a maioria dos planetas com massa similar à terrestre é fortemente enriquecida em elementos voláteis e é inabitável”, escrevem os pesquisadores em seu artigo, publicado na última edição do periódico “PNAS”.

DE ONDE VEIO ISSO?
Parece uma conclusão extraordinária. E é mesmo. Estamos falando de eventos hipotéticos ocorridos há 4,6 bilhões de anos, dos quais há praticamente nenhuma evidência. O trabalho é altamente especulativo e explora tudo que temos descoberto sobre a formação de planetas nas últimas duas décadas. Vamos recapitular esses passos, e aí a história da pesquisa vai se assemelhar muito à clássica desculpa de bêbado: “Sabe como é, uma coisa levou a outra…”

Tudo começa em 1995, quando o primeiro planeta em torno de outra estrela similar ao Sol, 51 Pegasi b, foi descoberto. Ele era um gigante gasoso, como Júpiter. Até aí tudo bem. O problema é que ele completava uma volta em torno de sua estrela em coisa de quatro dias. Era algo simplesmente impossível, a julgar por tudo que achávamos que sabíamos sobre formação de planetas. Bastou essa única e solitária descoberta para colocar nossos frágeis modelos em xeque, inspirados unicamente pela arquitetura do nosso próprio sistema. Vamos a ela.

Ao redor do Sol, os planetas estão distribuídos confortavelmente em longas órbitas, com os mundos rochosos e menores na região interna do sistema e os gigantes gasosos na região externa. O mais interno dos planetas, Mercúrio, é também o menor, e completa uma volta em torno do Sol em 88 dias.

Compare isso à bizarrice de 51 Peg b — um planeta gigante praticamente colado à sua estrela. Os cientistas estavam convencidos de que aquele mundo jamais poderia ter se formado ali, pois a estrela recém-nascida teria “soprado” todo o gás daquela região antes que o planeta pudesse acumulá-lo em sua volumosa atmosfera. Com isso, os astrônomos começaram a levar a sério a noção de migração planetária — o fato de que interações entre mundos recém-nascidos e o disco de gás e poeira que circunda a estrela e dá origem a eles poderia fazer com que suas órbitas se deslocassem.

No fim das contas, duas décadas e mais de mil exoplanetas depois, já sabemos que o caso de 51 Peg b era mesmo extremo — menos de 1% das estrelas têm um “Júpiter Quente” como ele. Contudo, também restava conclusivamente demonstrado que a migração planetária, em diferentes escalas, era um fenômeno bem possível e comum.

Ao mesmo tempo, com o aumento da amostra de sistemas, descobrimos que o nosso Sistema Solar também não era lá a coisa mais comum do Universo. Muitos dos exoplanetas menores que Júpiter se distribuem em órbitas bem mais próximas de suas estrelas que as vistas nos nossos quatro mundos rochosos — Mercúrio, Vênus, Terra e Marte.

Laughlin e Batygin citam em seu artigo o caso emblemático do sistema Kepler-11, descoberto em 2011, que tem seis planetas, todos eles com diâmetros entre duas e quatro vezes o da Terra, distribuídos por uma região apenas um pouco maior que a órbita de Mercúrio. Ou seja, onde aqui temos apenas um mundo com meio décimo da massa terrestre, lá existem seis planetas com uma massa total equivalente a pelo menos 40 Terras. E o detalhe sinistro: o Sol e a estrela Kepler-11 são bem parecidos, o que faz supor que talvez ambos tenham tido mais ou menos a mesma quantidade de material ao seu redor para formação planetária. Para onde foi essa joça toda em nosso Sistema Solar, considerando que os nossos quatro planetas rochosos não somam nem três massas terrestres?

REFINANDO O SISTEMA SOLAR
Enquanto isso, os modelos de formação do Sistema Solar encontravam suas próprias dificuldades. Mesmo modulando a quantidade de material para acabar com uma massa compatível com a dos planetas que temos por aqui, as simulações não produziam de jeito nenhum um Marte com o tamanho certo. Ele sempre saía “maior que a encomenda”, mais ou menos como a Terra.

Isso até 2011, quando um grupo de pesquisadores publicou na “Nature” um artigo sugerindo uma solução. A resposta estaria na migração de Júpiter. Suponha que ele tenha se formado a 3,5 UA de distância do Sol (uma unidade astronômica é a distância média Terra-Sol, cerca de 150 milhões de quilômetros) e depois migrado para dentro até uma posição a cerca de 1,5 UA, perturbando o disco de gás e poeira naquela região, para finalmente migrar para fora, até 5,2 UA (sua posição atual), puxado por Saturno, recém-nascido. Se tudo isso aconteceu, as simulações resultantes produzem Marte no tamanho certo e também explicam a distribuição dos objetos do cinturão de asteroides e a presença de água nos planetas rochosos.


A farra do Grand Tack, a migração temporária de Júpiter e Saturno (Crédito: Kevin Walsh et al.)

Desde então, essa hipótese, conhecida como “Grand Tack”, tem sido levada bastante a sério. Afinal, os exoplanetas mostram que migração planetária é um fenômeno mais que comum. Por que não poderia ter acontecido em nosso próprio sistema?

E foi aí que “uma coisa levou a outra” no trabalho de Laughlin e Batygin. Eles pensaram: e se o nosso Sistema Solar também começou com um monte de planetas na região interna do disco, que teriam se formado na mesma época de Júpiter, o que o Grand Tack teria causado em suas órbitas?

DEVASTAÇÃO
O resultado foi basicamente um massacre. As órbitas são bagunçadas, os planetas acabam colidindo uns com os outros, produzem uma reação em cadeia, tudo vira um monte de pedregulhos novamente e a maior parte desse material acaba caindo na direção do Sol. O que sobra acaba formando novos planetas — dessa vez bem menores e mais espaçados. Mercúrio, Vênus, Terra e Marte. Nós.


Imagem de uma das simulações de Batygin e Laughlin do que teria acontecido no nosso Sistema Solar — uma bagunça. (Crédito: Konstantin Batygin et al.)

Uma pergunta que pode ter ocorrido a você a essa altura: foi isso mesmo que aconteceu? Atenção para a resposta mais honesta que se pode dar em ciência: não sabemos.

ALTERNATIVA

Em contrapartida, outra hipótese tem sido defendida em trabalhos recentes pelo astrônomo brasileiro André Izidoro, pesquisador da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e da Universidade de Nice, na França. Em 2014, ele publicou um artigo no “Astrophysical Journal” mostrando que o Grand Tack não era realmente necessário para a formação de Marte — em vez disso, uma mera flutuação na densidade do disco na região poderia explicar o surgimento do planeta vermelho com seu tamanho observado.

“Ou seja, não pode ser assumido como verdade absoluta que Júpiter de fato migrou tanto para as regiões mais internas e voltou depois para uma região mais externa”, disse o astrônomo Jorge Meléndez, da USP (Universidade de São Paulo), que não participou de nenhum dos trabalhos. “O que eu não gostei do artigo da ‘PNAS’ é que ele não discute muito explicações alternativas, como a do trabalho do Izidoro”, completa.

Mas, se não houve Grand Tack, por que o Sistema Solar não tem lá suas superterras? Em parceria com alguns dos proponentes originais do Grand Tack, Izidoro acaba de mostrar que as superterras podem ser planetas originários das regiões mais externas que então migram para dentro — exceto se houver um gigante gasoso no meio do caminho para barrá-los. Em seu mais novo artigo, submetido em janeiro deste ano e aceito para publicação no “Astrophysical Journal Letters”, ele apresenta essa hipótese, sugerindo que Urano e Netuno — e possivelmente Saturno — talvez tivessem migrado para dentro e se tornado superterras ou mininetunos (terminando menores que seu tamanho atual por viajarem para regiões com menos gás durante sua formação), se Júpiter não estivesse no meio do caminho para impedi-los de passar.

Ou seja, Izidoro e seus colegas preveem que sistemas com muitas superterras próximas à estrela devem não ter gigantes gasosos afastados. E isso fornece um meio de testar a hipótese. No momento, apesar de quase 2 mil planetas descobertos, ainda nos faltam estatísticas confiáveis para apontar em qualquer direção. Se encontrarmos muitas superterras em sistemas com gigantes gasosos, saberemos que Izidoro está errado e Laughlin e Batygin devem estar na trilha certa. Por outro lado, se encontrarmos gigantes gasosos com no máximo uma superterra mais interna (as simulações mostram que, em algumas raras ocasiões, a superterra consegue “pular” o gigante gasoso e migrar para dentro sem ser ejetada do sistema), e mais frequentemente nenhuma, então saberemos que Izidoro e seus colegas acabaram acertando o alvo. Nesse caso, poderemos concluir que o Sistema Solar provavelmente nunca teve as superterras primordiais que a dupla da Califórnia propõe.

Talvez essa história toda seja cifrada demais para quem espera da ciência respostas claras e inequívocas. Mas hoje fizemos uma visita aos “porões da astronomia”, por assim dizer. Tiramos os esqueletos do armário e mostramos muito mais o que não sabemos do que o que de fato compreendemos. É aquele estágio de confusão que antecede os consensos, em meio a debates de hipóteses conflitantes, todas passíveis de teste por experimentos (no caso, simulações) e observações (no estudo de exoplanetas). E essa na verdade é a grande força da ciência. Ela não permite que as ideias — por mais belas que sejam — se sobreponham aos fatos. E, no processo, ainda ganhamos um lampejo mais claro da incrível força criativa da natureza. Ainda não sabemos com que receita exata se produzem as arquiteturas dos exoplanetas. Mas já temos a convicção de que elas são mais variadas do que sequer conseguimos imaginar. Que bom!

PARA IR MAIS FUNDO
Em tese, o texto acabou aí em cima. Mas, se você ainda não se cansou do tema, logo abaixo vai a entrevista que fiz com o russo Konstantin Batygin, um dos autores da hipótese das superterras solares, sobre seu trabalho na “PNAS”. Com 28 anos, ele é professor assistente do Caltech e foi eleito um dos “30 abaixo de 30″ da revista “Forbes”, que destaca os cientistas que despontam ainda jovenscomo expoentes acadêmicos. (Aviso aos navegantes: o papo é tão cabeludo quanto ele.)


O astrônomo russo Konstantin Batygin, autor do artigo das superterras solares. (Crédito: Caltech)

Pergunta – É interessante propor que o Sistema Solar tinha mais planetas mais internos que Mercúrio, mas isso não entra em conflito com nossos modelos mais aceitos de formação planetária quando aplicados ao Sistema Solar? A maioria dos pesquisadores tende a explicar exoplanetas próximos à estrela por meio de migração, em vez de formação in-situ. Por que vocês acharam que deviam inverter isso?

Konstantin Batygin - O modo exato de formação planetária, aplicado a sistemas planetários compactos, permanece uma questão controversa, mas de fato não é muito crucial para o modelo que apresentamos. Se nosso entendimento de formação de planetas gigantes está correto, então a formação de planetas sólidos, como superterras e netunos, deve acontecer antes da formação de Júpiter e Saturno, porque eles agem como núcleos que mais tarde acretam gás para se tornar gigantes. Além disso, formação de planetas gigantes é fundamentalmente não muito eficiente, de forma que o número de núcleos provavelmente excedeu o número de gigantes gasosos por uma fração substancial (as estatísticas extra-solares confirmam isso). Portanto, independentemente de as superterras terem se formado in-situ ou distantes e depois carregadas para dentro por migração extensa, é provável que elas tenham existido no Sistema Solar antes que Júpiter e Saturno tenham se formado e iniciado sua jornada.

Pergunta – Eu pensei que neste momento a maioria dos pesquisadores concordasse com a ideia de que os planetas gigantes (Júpiter e Saturno, no nosso caso) se formassem antes, porque eles precisavam acretar rápido o suficiente de forma que o gás não tenha ainda sido inteiramente dissipado pela estrela nascente. Esse é um problema antigo dos estudos de acreção de núcleos, mas eu estava com a impressão de que a maioria dos cientistas hoje já favorece modelos em que Júpiter vem primeiro, e os planetas terrestres têm mais tempo de crescer até seus tamanhos finais. Não é isso? A maioria dos cientistas planetários não acredita que Júpiter veio primeiro em nosso Sistema Solar?

Batygin - Bem, esse é um assunto complicado. No Sistema Solar, a formação de planetas evidentemente aconteceu em duas ondas — a primeira gerou os planetas massivos: Júpiter, Saturno, Urano e Netuno. Essa primeira onda levou menos de 10 milhões de anos para se completar. A segunda onda ocorreu numa escala de 100 milhões de anos e gerou os planetas de baixa massa: Mercúrio, Vênus, Terra e Marte. É convencionalmente presumido que a maioria dos exoplanetas em órbitas compactas participou de migração induzida pelo disco (embora, como eu disse antes, esse ponto seja discutível). Então eles devem ter sido gerados enquanto o gás estava por aí, e portanto deveriam pertencer ao mesmo grupo de planetas que Júpiter, Saturno, Urano e Netuno. Note que até mesmo no Sistema Solar, Urano e Netuno representam núcleos que fracassaram em acretar quantidades substanciais de gás (eles têm apenas cerca de uma massa terrestre de hidrogênio e hélio cada um). O que o nosso estudo faz é sugerir que Urano e Netuno não foram os únicos núcleos fracassados do Sistema Solar. Em vez disso, sugerimos que antes que Júpiter tivesse se formado (de acordo com modelos de formação convencionais, a acreção de Júpiter leva cerca de 3 milhões de anos), o Sistema Solar gerou vários núcleos que eram parte do mesmo processo dominante de formação planetária que é comumente responsável por planetas com órbitas compactas que observamos em torno de outras estrelas.

Pergunta – Se vocês estiverem certos, então planetas do tamanho da Terra encontrados em órbitas mais compactas em torno de outras estrelas deveriam ser fundamentalmente diferentes da Terra. Contudo, para a maioria dos planetas com massa e tamanho similares aos da Terra que tiveram sua densidade medida, encontramos valores entre os da Terra e de Mercúrio. Isso não entra em conflito com sua expectativa de que esses planetas mais internos tivessem maior quantidade de material volátil e fossem menos densos que a Terra?

Batygin - Na verdade, medidas de densidade de superterras extra-solares variam enormemente. Algumas são consistentes com a densidade de rocha, outras com gelo, enquanto outras são muito mais baixas, indicando que devem ser enriquecidas em hidrogênio e hélio. Há um viés, contudo: é mais fácil medir as massas de planetas com densidades maiores, então eles tendem a ter barras de erro melhores. Mas geralmente composições de planetas extra-solares sugerem que planetas como a Terra (aqueles sem atmosferas apreciáveis) são uma exceção à regra, em vez da norma.

Pergunta – Eu sei que as densidades variam bastante para planetas do tipo superterra, mas estudos mais recentes, apresentados na última reunião da AAS, parecem mostrar que há uma forte correlação com tamanho: menos que 1,6 raio terrestre tende a ser planeta rochoso, mais que 1,6 raio terrestre tende a ser mininetuno. Isso não derruba a ideia de que é a história do sistema, em vez de suas propriedades intrínsecas, o que determina quem acaba se parecendo com planeta gigante ou não?

Batygin - Essa é uma pergunta excelente, mas a resposta a essa questão não é trivial por duas razões. Primeiro é que a evaporação importa. Deve existir algum tamanho crítico de objeto numa dada órbita aquém do qual, mesmo que você comece com uma atmosfera rica em hidrogênio, ela acaba soprada durante os estágios iniciais de formação planetária (porque o fluxo extremo de UV pode ser muito alto). Esse tamanho pode ser muito bem 1,6 raio terrestre para órbitas típicas de exoplanetas. Segundo é que uma vez que frações significativas de gás são introduzidas, as relações de massa-raio dos planetas podem se tornar bem complicadas. Ou seja, torna-se difícil traduzir o que um objeto de 1,6 raio terrestre significa em termos de massa. Pode ser um objeto rochoso com 4 massas terrestres ou um objeto rico em gás com 1,5 massa terrestre. Ambos podem produzir o mesmo raio. No fim das contas, parece que uma fração substancial dos exoplanetas observados (na classe das superterras) se formou enquanto havia gás, o que é a premissa inicial do nosso trabalho.

Pergunta – Por fim, não temos de lidar com o fato de que temos um viés observacional forte em favor de sistemas compactos, seja qual for o método, velocidade radial ou trânsito? Isso não deveria contar para determinarmos quão estranho nosso próprio sistema planetário parece ser?

Batygin - Com certeza sim, e esse viés observacional é cuidadosamente levado em conta. Considerando isso, cálculos estatísticos sugerem que cerca de metade das estrelas similares ao Sol observadas possuem planetas em órbitas compactas menos massivos que 20 massas terrestres. Isso deveria ser comparado com a taxa de ocorrência de gigantes gasosos como Júpiter e Saturno, que é de apenas cerca de 10%. Então, embora a formação de planetas seja comum, seu modo dominante gera preferencialmente objetos sub-jovianos em órbitas compactas.

segunda-feira, 23 de março de 2015

OS PONTOS BRILHNTES DE CERES


Pontos brilhantes em Ceres parecem ser plumas de água, diz Nasa


23/03/15

É a pergunta que eu mais ouço por esses dias: e os pontos brilhantes na superfície de Ceres, o planeta anão? Ainda aguardamos a resposta definitiva, mas Andreas Nathues, líder da equipe da câmera da sonda Dawn e pesquisador do Instituto Max Planck, na Alemanha, apresentou as conclusões iniciais da Nasa, durante a 46a Conferência de Ciência Lunar e Planetária, nos Estados Unidos: provavelmente, são plumas de vapor d’água emanando de gelo localizado no fundo da cratera.

Imagem de Ceres obtida pela Dawn a 46 mil km do planeta anão revela dois misteriosos pontos brilhantes na superfície. (Crédito: Nasa)

Antes que alguém questione: ainda não há imagens disponíveis que sejam muito melhores do que as divulgadas até agora. E isso não é motivos para alimentar teorias da conspiração. Desde que a Dawn chegou a Ceres, no último dia 6, a espaçonave tem usado seus motores iônicos para suavemente espiralar na direção do maior membro do cinturão de asteroides, até atingir sua primeira órbita de trabalho, a 13.500 km de altitude, no fim de abril. Antes disso, no dia 10 de abril, haverá outra sequência de capturas de fotos, mas apenas 17% do planeta anão aparecerá iluminado. A coisa só ficará boa mesmo quando chegarmos ao final do mês e a Dawn desligar seus motores para a primeira bateria de observações científicas.

Contudo, ao analisar cuidadosamente as imagens já colhidas, os cientistas começam a apresentar suas interpretações e a produzir trabalhos científicos. E duas coisas estranhas marcam os pontos brilhantes. Por um lado, a topografia local parece indicar que eles emanam do fundo de uma cratera de 80 km de diâmetro e não estão numa elevação. Por outro lado, a análise do brilho conforme Ceres avança em sua rotação mostra que ele é fruto de reflexão de luz solar, mas que ainda permanece visível quando o fundo da cratera já está sob a sombra, além do chamado terminador — a linha que divide o lado iluminado do escuro.

“Durante o dia, o ponto evolui: ele fica mais brilhante. No anoitecer ele fica menos brilhante e na noite ele desaparece completamente”, disse Nathues em sua apresentação, segundo Emily Lakdawalla, blogueira da ONG Planetary Society que esteve no evento.

COMO EXPLICAR ISSO?

De acordo com Nathues, a melhor hipótese é que plumas de vapor d’água estejam emanando do fundo exposto de gelo da cratera. A coluna de vapor mais alta acaba refletindo luz solar quando o fundo já está no escuro, o que explica o padrão de luminosidade observado.

As imagens colhidas até agora são incapazes de “resolver” qualquer dos dois pontos brilhantes, ou seja, delineá-los com algum nível de resolução. Isso significa que o maior deles deve ter diâmetro menor que quatro quilômetros. A partir disso, os cientistas também puderam estimar o quanto de luz é refletido pela superfície (o chamado albedo) no ponto brilhante. Resultado: pelo menos 40% — mas pode ser muito mais. Esse nível de refletividade é consistente com uma superfície de gelo, mas não se trata da única explicação possível.

Juntando todas as peças, a confirmação de que Ceres tem algum tipo de atividade capaz de emanar plumas de vapor d’água — como já sugeria o Observatório Espacial Herschel, da Agência Espacial Europeia — parece estar mais próxima. Ainda falta compreender o que está produzindo essa atividade. Foi um impacto de asteroide que expôs o gelo no fundo da cratera? Criovulcões que expelem água, movidos pela pressão interna no interior de Ceres?

Aguarde cenas do próximo capítulo, conforme a Dawn se instala em sua órbita científica para transformar nossa compreensão do único planeta anão existente entre Marte e Júpiter.

sexta-feira, 13 de março de 2015

OCEANO EM GANÍMEDES


Nasa confirma oceano em Lua de Júpiter

12/03/2015


Cientistas que utilizam o Telescópio Espacial Hubble confirmaram que a lua Ganímedes, na órbita de Júpiter, possui um oceano por baixo de uma crosta superficial de gelo, elevando a probabilidade da presença de vida, afirmou a Nasa nesta quinta-feira (12).

A descoberta resolve um mistério relacionado à maior Lua do sistema solar após a nave Galileo, já aposentada, ter fornecido pistas sobre a existência de um oceano abaixo da superfície de Ganímedes enquanto cumpria uma missão exploratória ao redor de Júpiter e de suas luas, entre 1995 e 2003.

Assim como a Terra, Ganímedes possui um núcleo de ferro fundido que gera um campo magnético, embora o campo magnético de Ganímedes seja amalgamado ao campo magnético de Júpiter. Isso dá origem a uma interessante dinâmica visual, com a formação de duas faixas de auroras brilhantes nos pólos norte e sul de Ganímedes.

O campo magnético de Júpiter se altera com sua rotação, agitando as auroras de Ganímedes. Cientistas mediram tais movimentos e descobriram que os efeitos visuais se mostravam mais restritos do que deveriam.

Usando modelos gerados por computador, eles chegaram à conclusão de que um oceano salgado, capaz, portanto, de conduzir eletricidade, abaixo da superfície da Lua se contrapunha à atração magnética de Júpiter.

"Júpiter é como um farol cujo campo magnético muda conforme a rotação do farol. Isso influencia a aurora", explicou o geofísico Joachim Saur, da Universidade de Colônia, na Alemanha. "Com o oceano, a agitação fica significativamente reduzida."

Os cientistas testaram mais de 100 modelos computadorizados para observar se qualquer outro elemento poderia ter impacto sobre a aurora de Ganímedes. Eles também reprocessaram sete horas de observações ultravioletas do Hubble e analisaram dados sobre ambos os cinturões de aurora da Lua.

O diretor da Divisão de Ciência Planetária da Nasa, Jim Green, classificou a descoberta como "uma demonstração surpreendente".

"Eles desenvolveram uma nova abordagem para se observar a parte interna de um corpo planetário com um telescópio", disse Green.

Ganímedes se junta agora a uma crescente lista de luas localizadas nas partes mais afastadas do sistema solar que possuem uma camada de água abaixo da superfície.

Na quarta-feira (11), cientistas disseram que a lua de Saturno, Encélado, possui correntes quentes de água abaixo de sua superfície gélida. Entre outros corpos ricos em água estão Europa e Callisto, também luas de Júpiter.

sexta-feira, 6 de março de 2015

A SONDA DAWN CHEGA A CERES, O PLANETA ANÃO


A sonda americana Dawn entra em órbita do planeta anão Ceres nesta sexta-feira (6) e a pergunta que está na cabeça de todo mundo é: o que são os pontos brilhantes no interior de uma cratera vistos em sua superfície durante a aproximação? A Nasa já tem uma possível explicação, mas ainda aguarda imagens mais próximas para confirmar a hipótese. Tudo parece indicar que se trata mesmo de gelo exposto no fundo da cratera.


Concepção artística da sonda Dawn se aproximando de Ceres (Crédito: Nasa)

Claro, talvez isso seja menos emocionante do que uma base alienígena abandonada ou algo do tipo, mas trata-se de uma descoberta muito importante, caso seja confirmada: ela corrobora a desconfiança dos cientistas de que boa parte — uns bons 25% — da massa de Ceres seja água, a boa e velha H2O. Os pesquisadores especulam até que o planeta anão possa ter tido um oceano líquido no passado, a exemplo das luas Europa, de Júpiter, e Encélado, de Saturno, numa época em que Ceres tinha mais calor interno para derreter a água no subsolo. Hoje provavelmente não há mecanismo capaz de elevar a temperatura a ponto de liquefazer a água, mas nada impede que o maior dos membros do cinturão de asteroides entre Marte e Júpiter tenha sido amigável à existência de vida nos primórdios da formação do Sistema Solar.

Espera-se que a chegada da Dawn não sofra nenhum contratempo. A manobra de inserção orbital é bem menos emocionante do que costumam ser as chegadas de espaçonaves a Marte, por exemplo. Normalmente, uma sonda é enviada da Terra em alta velocidade, com praticamente todo o impulso dado nos primeiros minutos de viagem, e então precisa disparar seus propulsores a toda potência na hora certa para frear e, assim, ser capturada pela gravidade do planeta-alvo, sem “passar lotada”. Mas não é o caso da Dawn, que usa motores iônicos para se deslocar por aí.

O lema de um motor iônico podia bem ser “devagar e sempre”, pois ele dá uma aceleração muito suave à espaçonave, bem inferior à dos foguetes convencionais, mas gasta bem pouco combustível, o que permite mantê-lo ligado por anos a fio. Depois de tanto tempo acelerando de pouco em pouco, a sonda acaba acumulando grande velocidade. E por poder permanecer manobrando ativamente no espaço, a aproximação de Ceres é feita de forma a praticamente equalizar as velocidades do planeta anão e da nave em suas jornadas ao redor do Sol. Assim, é muito mais fácil deixar que ela seja simplesmente capturada pela gravidade do astro, sem requerer uma brusca freada na reta final. O resultado é uma manobra sem emoção — que inclusive será feita num momento em que Ceres irá se interpor entre a Terra e a Dawn. O resultado é uma interrupção momentânea das comunicações, que só será restabelecida depois que a sonda já estiver em órbita.

As últimas imagens divulgadas pela Nasa ainda fazem parte das manobras de aproximação e representam apenas uma fração da qualidade esperada para o fim de abril, quando a Dawn estará na órbita certa para o início das observações científicas. A partir do momento da captura orbital, a sonda acionará seus motores iônicos para reduzir a distância entre ela e a superfície de Ceres a meros 13,5 mil km. Para que se tenha uma ideia, até agora, as melhores imagens foram obtidas a 40 mil km de distância.


Um mapa completo da superfície de Ceres feito pela Dawn, com os pontos brilhantes (Crédito: Nasa)

E a qualidade também deve continuar subindo ao longo da missão científica, que deve ir até junho de 2016 e passará por quatro órbitas diferentes, cada uma menor que as demais. Na última etapa, a Dawn estará a meros 400 km do solo — mais ou menos a mesma altitude da Estação Espacial Internacional em torno da Terra. Depois que o trabalho estiver terminado, ela permanecerá em órbita de Ceres, desativada, por mais algumas centenas de anos.

O MISTÉRIO DOS PONTOS BRILHANTES

Mesmo sabendo que as imagens ainda irão melhorar muito, é impossível não especular: o que são os pontos brilhantes? “Eles são extremamente surpreendentes, intrigantes para todos”, disse Carol Raymond, cientista da missão, durante entrevista coletiva promovida pela Nasa no início da semana. “Seu brilho aparente estourou a escala.”

No momento, os pesquisadores trabalham com a hipótese de que possa ser um depósito de gelo e sais subterrâneo que acabou revelado pelo calor do impacto que gerou a cratera.

Uma hipótese alternativa, de que se tratasse de um fenômeno de criovulcanismo — um vulcão que expele água, em vez de lava –, não está descartada, mas também não está no topo da lista dos pesquisadores. “Um criovulcão resultaria em alguma formação de construção — algum tipo de deposição em torno do duto central, ou uma rachadura”, diz Raymond. “No caso dessa cratera, o ponto mais brilhante não está associado com uma formação de revelo positiva.”

Uma rotação completa de Ceres, planeta anão visitado pela sonda Dawn (Crédito: Nasa)

Contudo, uma das coisas surpreendentes revelada conforme a Dawn registrou imagens de uma rotação completa de Ceres — um dia lá dura pouco mais de nove horas — é que o brilho dos pontos ainda se mantém depois que a cratera já entrou na sombra. Não seria essa uma evidência de que o relevo é mais alto ali? Raymond explica que os dados ainda não foram completamente calibrados e por isso preferiu não especular mais. “É surpreendente que possamos vê-lo no terminador [a faixa que divide o dia da noite]. Não temos informação sobre a inclinação do terreno. Então vou parar por aí.”

Uma das evidências que reforçam que o brilho vem mesmo de gelo de água é o fato de que a posição dos pontos é compatível com as medições feitas remotamente pelo Observatório Espacial Herschel, da Agência Espacial Europeia, que no ano passado detectou suaves emissões de vapor d’água emanando de algumas regiões de Ceres.

A solução definitiva do mistério, contudo, ainda está adiante de nós, conforme a Dawn inicia para valer seu estudo científico do misterioso planeta anão. Não saia daí!

ASTRÔNOMOS ENCONTRAM ESTRELA EM RÁPIDA TRAGETÓRIA PARA FORA DA GALÁXIA


Impressão artística da fase de transferência de massa seguida de uma supernova de dupla detonação que leva à ejeção da US 708. Enquanto a ilustração mostra a supernova (abaixo, no centro) e a estrela ejetada (à esquerda) ao mesmo tempo, na realidade a supernova já teria desaparecido muito antes da estrela alcançar essa posição

Astrônomos encontraram uma estrela arremessada através da galáxia mais rápido do que qualquer outra já registrada, impulsionada pela explosão de uma enorme estrela irmã, disseram pesquisadores nesta quinta-feira (5).

A estrela, conhecida como US 708, viaja a cerca de 1.200 quilômetros por segundo, rápido o bastante para que deixe a Via Láctea em cerca de 25 milhões de anos, disse o astrônomo Stephan Geier, do Observatório Europeu do Sul, que opera três telescópios no Chile.

"Nessa velocidade você pode viajar da Terra à Lua em cinco minutos", observou o atrônomo Eugene Magnier, da Universidade do Havaí.

A US 708 não é a primeira estrela encontrada pelos astrônomos movendo-se rápido o suficiente para deixar a galáxia, mas é a única até agora que parece ter sido arremessada pela explosão de uma supernova.

As 20 outras estrelas descobertas até agora dirigindo-se para fora da galáxia provavelmente ganharam impulso ao se aproximarem demais de buracos negros gigantes encontrados no centro da Via Láctea, disseram cientistas em artigo publicado nesta semana na revista Science.

Antes ser arremessada através da galáxia, a US 708 era uma estrela gigante fria, mas teve todo o seu hidrogênio extraído por uma estrela irmã em sua órbita.

Cientistas suspeitam ter sido tal extração o que provocou a explosão da estrela irmã. Caso confirmado, esses tipos de estrelas arremessadas podem fornecer mais dados sobre como ocorrem as explosões de supernovas.

ASTRÔNOMOS DESCOBREM PLANETA GIGANTE COM QUATRO SÓIS.



Planeta possui quatro sóis e tem 10 vezes a massa de Júpiter

Um planeta gigante, pelo menos dez vezes maior que Júpiter, com grande massa gasosa e que orbita em torno de quatro sóis. Assim é o exoplaneta KIC 4862625, do sistema estelar Ari 30, nova descoberta divulgada nesta quarta-feira (4) pela Nasa, a Agência Espacial americana.

Além de ser o segundo planeta com quatro sóis que se tem notícia, este chamou a atenção dos astrônomos por não apresentar uma superfície real, ou seja, sem um núcleo sólido.

Até então, pensava-se que o KIC 4862625, descoberto há alguns anos, tinha três sóis. Mas com a utilização de um sistema Robo-AO no telescópios do Observatório Palomar, em San Diego (EUA), foi possível remover os efeitos da atmosfera e melhorar a visualização. O primeiro planeta com quatro sóis foi descoberto em 2013 por cientistas da missão Kepler.

O sistema Ari 30, os cientistas sabem agora, é um planeta e dois sistemas binários. E é altamente improvável que ele tenha vida por ali.

Lewis Roberts, principal autor da descoberta divulgada na revista americana "Astronomical Journal", e seus colegas querem entender qual a influência de tantos sóis no planeta, que orbita a 136 anos-luz da Terra, e tudo indica que este tipo de sistema multi-solar, que geralmente consiste de dois pares de estrelas gêmeas circulando uns aos outros a grandes distâncias, é mais comum do que se imagina.
A evidência sugere que os sóis podem influenciar o destino dos planetas, alterando as órbitas e até mesmo provocando o crescimento mais maciço deles.

A estrela recém-descoberta parece não ter afetado a órbita do planeta. A razão exata para isso é incerta, por isso a equipe está planejando novas observações.

quinta-feira, 5 de março de 2015

VIAGEM NO TEMPO



Ilustração de "wormhole" (buraco de minhoca), um atalho no universo que permitiria viajar no tempo-espaço

Com falta de água e de energia, excesso de poluição e florestas cada vez mais ameaçadas, a ideia de habitar um outro planeta e começar tudo de novo cai como uma luva. A questão é que, se o ser humano ainda não conseguiu pisar nem em Marte, imagine explorar planetas de outros sistemas solares ou galáxias.

Sem tecnologia disponível para percorrer tamanhas distâncias, a solução seria encontrar um atalho, ou melhor, um "buraco de minhoca", como mostrado no filme "Interestelar", de Christopher Nolan.

"Buracos de minhoca são maneiras especiais de se dobrar o espaço-tempo de forma a conectar dois 'eventos' através de um 'intervalo' menor do que aquele que seria possível em um espaço-tempo plano", explica o físico Cássius Anderson de Melo, professor da Universidade Federal de Alfenas - Campus Poços de Caldas e da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

Entenda como "evento" tudo o que acontece no Universo, ensina o professor. Já o "intervalo" é uma espécie de distância entre os eventos, mas que leva em conta não apenas a distância espacial entre eles, como também o tempo em que ocorreram.

Para tentar ilustrar a ideia para os leigos, o físico Adilson de Oliveira, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) sugere que você imagine um tecido esticado, como uma toalha. Pense, então, em dois pontos desenhados em cada uma das extremidades, separados por todo o comprimento do pano.

Imagine que algo extremamente pesado caia no meio do pano. Isso vai provocar uma curvatura naquele "espaço", fazendo o tecido se dobrar como uma folha de jornal. E os pontos, antes nas extremidades, passam a ficar bem próximos um do outro. Com uma agulha grossa, você pode fazer um furo para conectá-los, o que faria do objeto pontiagudo um buraco de minhoca.
Verme de fruta

O nome dado a essa estrutura foi pensado por causa dos vermes das frutas ("worm", em inglês, pode ser traduzido como verme ou minhoca e "hole" significa buraco). Como esses bichos, um eventual viajante no espaço-tempo, em vez de se mover pela "superfície da maçã", pegaria um atalho para o lado oposto por meio de um túnel em seu miolo. É o que fizeram os personagens de "Interestelar" para chegar ao sistema planetário dominado por um buraco negro, chamado Gargântua.

Mesmo quem não assistiu ao filme de Nolan deve saber que ele foi feito em parceria com um pesquisador aposentado do Caltech (Instituto de Tecnologia da Califórnia), Kip Thorne. Basta dizer que Thorne foi um dos maiores estudiosos dos buracos de minhoca, e teve suas pesquisas supervisionadas por John Wheeler, físico que cunhou o nome, em 1957, em analogia aos vermes de frutas.

Albert Einstein, em parceria com outro cientista, chamado Nathan Rosen, chegou a especular sobre algo parecido com o que hoje se chama de buraco de minhoca, mas o tema não chegou a ser desenvolvido.

"Inicialmente, a ideia de Thorne era apenas estudar soluções de simetria cilíndrica; porém, após um telefonema de Carl Sagan, que estava escrevendo um livro de ficção (o famoso 'Contato'), Thorne percebeu que havia uma nova via teórica a ser explorada: como formar buracos de minhoca", conta o professor da Federal de Alfenas.

O fato de Thorne ter ajudado Nolan faz o filme parecer realista, do ponto de vista científico, embora vários "furos" já tenham sido criticados por especialistas, na imprensa. Mas será que buracos de minhoca são mesmo possíveis, ainda que sua existência não tenha sido comprovada?

Pelos conceitos da Física atual, não há nada que proíba essa possibilidade. Já dizer que ela existe é algo bem diferente. "A matéria necessária para isso deveria ter propriedades muito estranhas, como energia negativa, por exemplo", diz Melo.

Graças aos imensos aceleradores de partículas, hoje sabe-se que é possível provocar essa energia negativa muito rapidamente. Manter um buraco a ponto de alguém atravessá-lo é outra história.
Enormes ou microscópicos

Para causar tamanha deformidade no "tecido" do espaço-tempo, o objeto teria que conter uma energia considerável. "Essa matéria teria de ser diferente de tudo que conhecemos aqui na Terra, ou mesmo que já tenhamos observado pelo Universo", comenta Adilson de Oliveira.

Vale esclarecer que as deformidades no espaço-tempo são criadas o tempo todo por causa da gravidade, como previu Einstein. Cada um de nós, assim como o nosso Sol, provoca algum estrago, só que ele é desprezível.

"Para haver efeitos significativos seria necessário objetos muito massivos como buracos negros ou estrela de nêutrons para produzi-los. Mas até agora nenhum objeto como esse foi diretamente observado", diz Oliveira.

Se essa matéria bizarra, que tornaria os buracos de minhoca viáveis, realmente existisse em grandes quantidades e há bastante tempo, ela certamente produziria um efeito que já teria sido observado pelos cientistas, afirma o professor da UFSCar.

Por isso, físicos como Stephen Hawking já especularam que, se os buracos de minhoca existem, eles devem ser microscópicos tanto no espaço quanto no tempo, a ponto de não produzir nenhum grande efeito. Eles seriam como as falhas que existem em qualquer tipo de tecido.

"Buracos de minhoca grandes e estáveis, de tamanho astronômico (tamanho de planetas ou maiores) ou não existem ou são tão raros que seria mais fácil alguém ganhar na Mega Sena dez vezes seguidas (sem maracutaia!); os microscópicos também precisariam ser tão pequenos e breves que não alterariam nada daquilo que observamos usualmente", defende Melo. "Dizer se isto ou aquilo será observado algum dia é muita especulação para um cientista profissional."

Dá para perceber que o assunto é tão complexo, que a solução encontrada no filme de Nolan foi a de que uma civilização extraterrena avançada teria sido a responsável pela abertura do túnel no espaço-tempo. Transferindo a "batata quente" para a ficção, fica mais fácil justificar a existência de um buraco tão profundo.